A Arquitectura não Veste Prada

A Arquitectura não veste Prada

A consciência da escassez e finitude dos recursos e a sustentabilidade da vida humana na terra impõem a refundação da nossa relação com a natureza e lugares. Relação envolvendo uma nova ética de comportamentos perante as realidades, natural e construída, em presença, que assegurem a perenidade da sua harmonia, riqueza, diversidade e identidade. A arquitectura como objecto social traduzirá na sua estética esta nova consciência global. Assim, a moda, o moderno, o novo, o actual, o vanguardismo, passa, cada vez com mais clareza, pelo que perdura. A valorização mediática da moda como o gosto do momento; usos, tiques, e poses sociais passageiras; dará lugar à moda do que perdura. Produzir bens com recursos recicláveis não chega, o futuro obriga-nos à exploração da eficiência tecnológica disponível para produzir bens duradouros.

O título em cima não quer significar nada contra a antiga e, justamente, famosa, casa de Milão, cujas criações até aprecio, como por exemplo a proposta para o próximo Outono-Inverno. A imagem em baixo corresponde à proposta PRADA para esta Primavera-Verão. O título é inspirado no filme “O diabo veste PRADA”, realizado em 2006 por David Frankel, com a participação da, duradoura, actriz Meryl Streep. O filme (sinopse minha) reproduz uma realidade dominada pelo culto do fugaz onde uma jovem, a quem prometiam o mundo (aquele mundo) vem demonstrar, com desagradável incómodo para os, fugazmente, poderosos, que há quem resista à falta de ética, à ditadura da imagem e à impostura do ilusório.

A arquitectura não veste PRADA porque é contrária: à obsessiva promoção do fugaz e estereotipado; à imagem sem conteúdo; ao apagamento dos valores da diversidade, identidade e talento. Porque não deixa de se usar, a arquitectura não passa de moda. Tal como dos grandes clássicos da literatura (são clássicos, exactamente, porque estão sempre na moda), continuamos a gostar da arquitectura do passado; e se gostamos é porque tem sentido actual; e se tem sentido actual está na moda. Como os bons livros, a arquitectura não é para entreter e esquecer é para continuar a ser útil. Quando um livro é bom sentimos necessidade de voltar e lê-lo na procura de novas respostas; também na arquitectura do passado, mais recente ou mais distante, podemos encontrar, com a eficiência tecnológica disponível, respostas para necessidades presentes.

Somos herdeiros de muita arquitectura que não podemos deixar passar de moda. Arquitectura que se revela, pelo ambiente de escassez que a soube produzir, lançada do seu tempo para a vanguarda do nosso. Escassez, sobretudo, de recursos antes e hoje de recursos e de espaço. Arquitectura, com a eficiência tecnológica que a assiste, ávida de continuar a servir e a identificar-nos, salvaguardando a nossa memória e com isso o nosso futuro. Arquitectura que apenas aguarda a merecida, para não dizer imperativa, oportunidade.

Como já fizemos no passado, estamos de novo obrigados a fazer o firme, o útil, o belo e o novo, em realidade de escassez e através da conveniente (re) utilização de espaço e património construído.

Adelino José Rosa Rodrigues, Arq.