As Estrelas Também se Abatem

Janela da Estalagem do Caçador, em Macedo de Cavaleiros

Quando atinge o valor de arte, a obra liberta-se do seu autor e deixa de lhe pertencer. A obra de arte tem existência misteriosa e própria que perdura. Essa existência transforma-a num valor colectivo do património cultural e da identidade de um povo, nação, ou civilização.

A Estalagem do Caçador deve-se ao seu mentor e pertence aos seus proprietários. Isto é claro. Mas, tal como uma obra, quando arte, se liberta do seu autor, também a Estalagem do Caçador quando, pela história e prestígio, se transforma num símbolo e numa marca da nossa terra, atinge uma dimensão além dos limites de um bem privado, passando a constituir um valor colectivo.

Sem sombra de rejeição do mérito do seu mentor e seguidores, o carisma, único, da Estalagem do Caçador foi também construído pelo lugar. O lugar é a nossa terra e o poder do seu fascínio. Por isso, quando a Estalagem do Caçador, pela livre vontade dos seus proprietários, fecha a porta, não é apenas um bom estabelecimento hoteleiro que encerra, é também um valor insubstituível do nosso património cultural e da nossa memória comum que desaparece.

O fecho da Estalagem do Caçador foi uma grande desilusão colectiva e foi, com certeza, uma pesada frustração para aqueles que, por nós mas em vão, deram o melhor de si e das suas competências para impedir tal desfecho e tão rude golpe no nosso património cultural.

À gravidade do fecho seguiu-se um incivil silêncio. Porque fechou? Porque falharam os esforços para evitar o fecho? Qual o futuro da Estalagem do Caçador? Na falta da devida e esperada clareza vai surgindo o obscuro e pestífero rumor. Não pode ser assim. Para além de nos deixar mais pobres, o sucedido, como sucedeu, causa anomalias ao nosso ego colectivo, notórias no dia-a-dia da cidade.

Sempre que uma porta como esta se fecha, perde-se luz e respira-se pior. A Estalagem do Caçador era a nossa melhor ponte com o mundo. O seu desmoronamento deixa-nos mais isolados e esquecidos.

Adelino José Rosa Rodrigues